
(*) Jorge Gama
Vivemos um tempo em que a informação circula em volume inédito, mas nem sempre esclarece. Ao contrário: muitas vezes desorienta. Recentemente, ao assistir a um vídeo nas redes sociais sobre a chamada “desorientação controlada”, resolvi aprofundar a reflexão sobre esse fenômeno social que, embora antigo, ganhou nova sofisticação no mundo digital.
A desorientação controlada pode ser compreendida como a perda de referências construída de forma intencional, limitada e monitorada, com objetivos específicos, sem que se chegue ao caos absoluto ou à perda total de controle. Não se trata de desorganização espontânea, mas de um processo administrado.
Esse mecanismo não é novo na orientação das massas. Ele se manifesta como uma técnica informacional dirigida, capaz de preservar uma margem de segurança para quem exerce o controle. À primeira vista, surgem narrativas conflitantes. No fundo, porém, elas frequentemente convergem para um mesmo propósito. Esse método pode ser observado na economia, na política, nos processos eleitorais, na dinâmica dos fatos sociais e até no campo científico.
A pandemia foi um exemplo emblemático. O volume exponencial de informações, muitas vezes contraditórias, produziu um ambiente de temor cuidadosamente monitorado. Versões surgiam e desapareciam com rapidez, substituídas por novas narrativas, tornando o ambiente social progressivamente mais inseguro e confuso.
É preciso reconhecer que, nos primeiros momentos, a desorientação não era programada. Havia uma emergência coletiva real e informações incompletas. Contudo, em determinado ponto, o cenário muda. Inicia-se a administração do caos: hierarquizam-se narrativas, selecionam-se dúvidas aceitáveis e, por fim, excluem-se visões divergentes consideradas inoportunas.
Nesse estágio, a desinformação controlada passa a funcionar como ferramenta de gestão da crise, submetida a comandos claros, ainda que pouco visíveis.
Com a ascensão das redes sociais, abriu-se inicialmente uma nova janela para a circulação da informação. O controle antes concentrado no Estado e nos meios tradicionais perdeu força. Esse intervalo, porém, foi breve. Logo se estabeleceu uma nova forma de controle, agora exercida de maneira difusa e anônima pelas grandes plataformas digitais, pelas chamadas big techs e pelos algoritmos.
As redes não libertaram totalmente a informação. Elas fragmentaram o discurso público e criaram um novo tipo de hegemonia. Ampliaram o direito à voz, mas sem abdicar do controle.
Vivemos, assim, um tempo novo: ao menos já reconhecemos a existência da desinformação controlada. E aquilo que pode ser percebido pode, também, ser analisado e confrontado.
Haverá sempre um espaço.
(*) Jorge Gama é advogado e ex-deputado federal.