
(*) Jorge Gama
A evolução acelerada das redes sociais transformou profundamente a forma como consumimos e difundimos informação. Hoje, a notícia clássica — estruturada nos pilares fundamentais do jornalismo: como, quando, onde, quem, por quê e para quê — vem cedendo espaço a narrativas formadas pela velocidade, pela disputa de versões e pela busca por impacto imediato.
Nesse novo cenário, muitos conteúdos deixam de ser notícias propriamente ditas para se tornarem construções discursivas que privilegiam a verossimilhança em detrimento da verdade factual. Ou seja, importa menos o que ocorreu e mais o que parece ter acontecido, ou o que se deseja sugerir ao público.
O exemplo é ilustrativo: afirmar que “o STF tem unanimidade para manter a prisão de Bolsonaro” não traduz o fato real e induz o leitor a um entendimento incorreto. A Corte, como órgão pleno, não deliberou sobre o tema. Quem se manifestou foi a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, composta por apenas cinco ministros — menos da metade do Tribunal. A formulação correta, portanto, seria: “A Primeira Turma do STF, composta por cinco membros, tem maioria para manter a prisão de Bolsonaro.”
Esse deslocamento do fato para a narrativa é um fenômeno contemporâneo. A precisão jornalística foi substituída, em parte, pela celeridade da circulação de informações nas redes. A complexidade institucional é simplificada ou eliminada, e o rigor técnico se perde em favor de textos mais rápidos, mais diretos e com maior carga interpretativa.
Duas consequências centrais desse processo se destacam:
1. A simplificação excessiva da realidade para adaptar os fatos a manchetes instantâneas.
2. A substituição gradual da figura do repórter pela do comentarista, que interpreta antes de informar.
Quando os elementos essenciais da notícia deixam de ser apresentados de forma clara, a sociedade passa a consumir versões, impressões e interpretações — não fatos. Isso transforma o ambiente informacional em um campo de disputas narrativas, no qual a verdade passa a competir com a aparência de verdade.
Recuperar a separação entre notícia e narrativa é um desafio fundamental da comunicação contemporânea. Somente assim será possível restaurar a confiança do público e garantir que o cidadão receba informações capazes de sustentar decisões conscientes em uma democracia.
Outra observação pertinente é a questão da pauta, sobretudo na grande imprensa, que quase sempre é ditada pelo título da matéria geralmente anunciado na primeira página. É nesse contexto que podemos observar a semelhança de um tipo de conteúdo dirigido, variando ligeiramente no texto para preservar o cerne da mensagem. É nesse momento que percebe-se os indícios de uma campanha em andamento.
(*) Jorge Gama é Advogado e ex Deputado Federal.